segunda-feira, 30 de junho de 2008

O abutre

Sei que dirão: lá vem o abutre,
Aquele poeta triste e sombrio
Que tem prazer e que se nutre
De coisas que dão arrepios.

Pois que digam. Pouco me importa,
Falar de tristezas não é o que almejo.
Não me apraz cantar as coisas mortas
Mas eu só pinto aquilo que eu vejo.

E tudo que eu vejo é melancolia,
Olhos marejados de desesperança
São bocas suplicantes e vazias
De infelizes e desnutridas crianças.

O negro da alma humana é fértil terra
E rápido a maldade nele grassa,
É é nesse vil terreno que se encerra
A sombra da infâmia e da desgraça.

O mundo está podre, está bichado,
Ninguém se importa com o seu semelhante,
Cada qual só vê o próprio lado
Num proceder covarde e revoltante.

Sim. Sou um ser humano aziago,
Trago na testa a insígnia do mal.
Sou pesadelo e nas noites vago
Com a certeza de um triste final.

Tu não desejas a minha presença,
Tu me desprezas e me repudias,
E me evitas como uma doença,
Mas não devias, por que sou tua cria.

Um comentário:

Isaías Gresmés disse...

Excelente poema. O poeta não deve temer o que escreve. E o poeta é nutrido pelos fatos da vida. E a sociedade que leia os versos tristes do poeta, quem mandou criar a tristeza?